PARALISIA CEREBRAL, UM TABU A SER QUEBRADO

terça-feira, 8 de setembro de 2009

NOTICIA - 'Bastidores do CQC têm piadas, tensão, tietagem e novela da Globo'

Segunda-feira, 7 de setembro. Dentro de um estúdio da TV Bandeirantes, 190 jovens se espremem numa arquibancada improvisada. Estão ali já há uma hora. São 22h26 e todos escutam o áudio, sem ver as imagens, do programa “Videonews”, que a emissora exibe naquele momento. De repente, de forma abrupta, a apresentadora avisa: “A seguir, CQC”. De frente para a plateia no estúdio, a produtora Mariana Nagata de Cicco pede palmas e aplausos. A galera urra de alegria. O chão treme.

  • Veja o fotoshow do que acontece por trás das câmeras do "CQC"

Flávio Torres/Fotomidia

À "paisana", Marco Luque e Rafinha Bastos aguardam no camarim o início do programa

Aguardando num canto improvisado atrás do palco, os apresentadores Marcelo Tas, Rafinha Bastos e Marco Luque entram em cena e assumem seus lugares na bancada. É tudo muito rápido. Sem intervalos comerciais, está começando a edição número 69 do “CQC”, “o programa da família brasileira”, como anuncia Marcelo Tas, sublinhando a ironia involuntária entre o lema da atração, o número da edição e o feriado nacional. “O programa de hoje está patriota e sem vergonhinha”, avisa o apresentador. A plateia vai ao delírio.

Lançado em março de 2008, o “CQC” cumpre sua segunda temporada de sucesso no Brasil. Programa de atualidades, comenta notícias da semana misturando jornalismo com humor e pegadinhas – um modelo polêmico, criado na Argentina em 1993, onde ocupa o horário nobre da principal emissora do país. Com média de 5 pontos no Ibope, dobrou a audiência que a Band obtinha no horário.

Criação da produtora Cuatro Cabezas, que o co-produz com a Band no Brasil, o “CQC” é um programa argentino que fala português. Uma mistura que dá muito certo, mas não deixa de produzir faíscas, constatou a reportagem do Último Segundo, presente no estúdio da Band desde as 19h para acompanhar os bastidores do programa.

No camarim do CQC já estão os três apresentadores e os dois roteiristas, Alex Baldin e Marco Aurélio Góes dos Santos. Prosaicos sanduíches de metro, encomendados numa padaria, e latinhas de Coca-Cola estão à disposição da equipe. Um dos apresentadores pede para não ser fotografado com o refrigerante, já que a rival Pepsi é uma das patrocinadoras do programa.

Tas nega interferência de Lula

Às 19h30, cinco estudantes da Faculdade Anhembi Morumbi chegam para entrevistar Tas. O apresentador será tema de um livro biográfico, a ser apresentado como trabalho de conclusão de curso. A primeira pergunta é boa: “Você fala que não se preocupa em saber se o ‘CQC’ é um programa de jornalismo ou entretenimento. Mas se preocupa com a ética? Já aconteceu de o programa ultrapassar a linha?”

“Sim”, responde Tas. “O programa já extrapolou o limite do respeito e da ética. Mas os meninos (os repórteres e demais apresentadores) ouvem muito. A gente conversa”, diz, garantindo que discutem em equipe tudo que acontece, para não repetir os erros.

As meninas perguntam a Tas sobre as dificuldades de fazer o “CQC”. O apresentador comenta: “O chato é que a gente é um programa jornalístico, mas com exigência técnica de um programa de ficção. Acho que dá para fazer o ‘CQC’ mais leve.” Só isso? “Outra coisa chata são os telefonemas que recebo, especialmente com o prefixo 61 (de Brasília).”

É verdade, perguntam, que o presidente Lula pediu ao “CQC” para pegar mais leve? “Mentira. Não tem nenhum fundamento”, diz. “Estou vivendo um papel novo aqui. Defender a linha editorial do programa. Negociar, convencer, explicar. Porque o programa até hoje é visto como um óvni.”

Flávio Torres/Fotomidia

O apresentador Marcelo Tas conversa com estudantes do jornalismo sentado na plateia

Show de piadas no camarim

Às 20h10, voltamos para o camarim. Com 2 metros de altura, apesar do nome no diminutivo, Rafinha Bastos conta uma piada atrás da outra. Parece estar encenando “A Arte do Insulto”, o espetáculo de stand-up comedy que apresenta.

Flávio Torres/Fotomidia

Luque brinca com boneco em miniatura

Depois de contar uma piada sobre cariocas, que todos acham muita graça, informo que sou carioca. E Rafinha prossegue, imitando o jeito dos cariocas. Pergunto se posso publicar a piada. Ele pede que não. “No show eu também faço piada de paulista, de gaúcho... Se você contar só uma, fica fora do contexto”, justifica.

Rafinha relata que uma vez um fã reclamou com ele sobre a insistência de suas piadas sobre a sexualidade dos gaúchos. “Dá uma força aí para quebrar esse estigma”, pediu o fã, gaúcho. “E o pior é que o cara era de Pelotas”, ri o humorista.

“Os estereótipos pegam porque em algum momento alguém se sentiu ofendido”, teoriza Rafinha. Marco Luque entra na conversa e faz piada sobre a sexualidade de Rafinha, que ouve a provocação sem responder.

Alex e Marco Aurélio, os roteiristas, explicam que escrevem piadas de acordo com o perfil de cada um: “Rafinha é mais ‘agressive’, faz piadas autodepreciativas e piadas de referência”, diz Alex. “O Luque é mais nonsense, mais insano. Exploramos elementos biográficos dele”, continua. “Eles criaram um monstro”, reage Luque.

Qualquer deslize é motivo de piada entre humoristas afiados. A tevê no camarim exibe uma longa reportagem sobre Cauby Peixoto. Marco Aurélio pergunta: “Cauby morreu?”. E Rafinha emenda: “Vai sentir saudades dele?”

Pegando no pé do argentino

Chega ao camarim, por volta das 20h30, o diretor Juan Buezas. Há dez anos na Cuatro Cabezas, na Argentina, Buezas assumiu este ano a direção do “CQC” brasileiro. Substituiu Diego Barredo, que agora é o responsável por todas as operações da produtora no Brasil (eles produzem também o “E24” na própria Band e preparam um novo programa para 2010).

Faltam menos de duas horas para o CQC entrar no ar e é chegada a hora de repassar o roteiro do programa. Marcelo Tas, porém, ainda está atendendo as estudantes de jornalismo. Buezas parece tenso, mas aceita sem reagir as piadas de Rafinha, Luque, Alex e Marco Aurélio sobre a derrota da Argentina para o Brasil, no sábado.

Às 20h45, Marco Luque começa a se vestir. Num canto do camarim, há três jogos com os ternos pretos que os apresentadores vestirão durante o programa. Um pedaço de papel identifica cada um. O de Marcelo Tas está escrito “Marcelo Taz” – o que é motivo para mais piadas.

Tas chega ao camarim, finalmente, e a reportagem do Último Segundo é convidada a se retirar. Buezas explica que a reunião às vésperas de o programa ir ao ar é fechada. Superstição.

Na maquiagem, “Caminho das Índias”

No pátio interno da Band, os jovens que conseguiram ingresso para assistir o “CQC” se aglomeram, cantam, gritam e se fotografam. “Já temos plateia agendada até o fim do ano”, explica uma produtora.

Flávio Torres/Fotomidia

Rafinha Bastos na sala de maquiagem; na televisão, novela da emissora concorrente

A reunião de passagem do roteiro, que normalmente dura uma hora, é encerrada em pouco mais de 40 minutos. Já vestidos com seus ternos pretos, os apresentadores correm para a sala de maquiagem. Boris Casoy, apresentador do telejornal que vai ao ar depois do “CQC”, está acabando de ser maquiado. Na tela da televisão dentro da sala, a maquiadora acompanha “Caminho das Índias”, a novela da concorrente Globo.

Nesta segunda-feira, há uma excitação maior no ar. Pela primeira vez, haverá uma disputa ao vivo pela eleição do oitavo integrante do “CQC”, um concurso que atraiu milhares de candidatos e está chegando à reta final. Quatro dos últimos oito candidatos vão aparecer no programa e dois serão selecionados para a penúltima etapa.

Diego Barredo explica o que o “CQC” está procurando: “Alguém diferente dos que já temos. Tem que ser esperto, engraçado...”. Tas acrescenta: “Há diferentes visões aqui dentro sobre isso. Estou alinhado com o Barredo. Quero ser surpreendido. Quero alguém que traga algo que a gente não tenha pensado”.

Rafinha se aproxima, na porta da sala de maquiagem. Diz que o fato de conhecer um dos oito finalistas, o humorista Rogerio Morgado, não influi em nada. “Ele não pode ser prejudicado pelo fato de a gente se conhecer. Aliás, acho até que prejudica”.

Na sala de controle

São 22h. Faltam 20 minutos para o programa ir ao ar. Estão todos prontos e maquiados. Rafinha e Luque se dirigem para o palco e começam a animar a platéia com piadas. Fazem uma espécie de stand-up para “aquecer” o público. Tas se dirige à sala de controle, o chamado “switcher”, onde ficam os diretores e editores.

O apresentador quer ver os vídeos escolhidos pela produção para o quadro “Top 5”, que apresenta semanalmente imagens engraçadas ou bizarras. Com o roteiro em mãos, o apresentador faz anotações, que o ajudarão, ao vivo, minutos depois, a apresentar cada um dos vídeos.

Flávio Torres/Fotomidia

O diretor Juan Buezas acerta detalhes com os já apresentadores a postos na bancada

Às 22h15, Tas desce do “switcher” e se dirige para o palco. Pelo microfone, aberto, o diretor Juan Buezas avisa: “A qualquer momento entramos”. O “CQC” não tem um horário exato para começar. Entre 22h15 e 22h30, realmente, “a qualquer momento” pode começar. O diretor aguarda os intervalos comerciais da concorrência para colocar o seu programa no ar.

Com Globo e Record nos intervalos comerciais, mais espectadores podem sintonizar na Band no momento em que a atração da casa estiver começando. É o que acontece às 22h27 desta segunda-feira.

Clima na plateia

Ao final do primeiro bloco, um espectador é retirado da platéia. Ele é acusado de ter obstruído uma das câmeras do programa, com um casaco, violando as regras de comportamento determinadas pela produção. Alguém grita da plateia que não foi o menino que jogou o casaco. Rafinha Bastos se manifesta e pede que o verdadeiro culpado se acuse. Ninguém se manifesta. Ao final do programa, depois de rever as imagens do incidente, a produção chegou à conclusão que identificou o espectador errado.

Flávio Torres/Fotomidia

Na palma da mão: produtora pede aplausos


O programa exibe matérias longas sobre o jogo entre Brasil e Argentina, em Rosario, e o lançamento do pré-sal, em Brasília. Marcelo Tas imita Lula ao chamar a reportagem de Rafael Cortez. Às 23h25, o próprio Cortez chega à Band para assistir o final do programa – e a plateia feminina vai ao delírio.

Tensão: o Ibope, minuto a minuto

Subo ao “switcher” para assistir à segunda metade da edição. Diego Barredo, Juan Buezas e outros dois argentinos comandam a operação. Barredo fica diante de um monitor de computador acompanhando o Ibope, minuto a minuto. O “CQC” começou com 1,6 e foi subindo. Às 23h09, alcançou o seu pico, com 7,5 pontos. O que era exibido na hora? “Nada especial. Era o break da Globo”, explica Barredo, tranquilo.

Buezas está tenso e irritado. Reclama de Marcelo Tas, que estaria demorando muito nas explicações de cada vídeo do “Top 5”. “Vamos, Marcelo!”, cobra Buezas pelo ponto eletrônico, conectado ao ouvido do apresentador. O programa está atrasado, ou seja, talvez não tenha tempo para exibir todas as atrações programadas.

O diretor vê o programa por seis câmeras diferentes. Também tem à disposição pequenas telas que exibem a programação de cinco emissoras concorrentes. Todos olham o tempo todo para o monitor do Ibope, que Barredo controla. “Quanto está?”, é uma pergunta frequente, que vem de todas as direções da sala.

Durante o intervalo comercial do “CQC”, Buezas e Barredo decidem mudar a ordem estabelecida no roteiro e cortar um dos quadros da edição, o “CQ Teste”. Logo a informação corre: “Vai cair o CQ Teste?”, alguém pergunta. “Vai.”

A disputa para ser “o oitavo elemento”

Assisto à disputa entre Rogerio Morgado e Marcel Oliveira pela vaga de oitavo integrante do programa. Os dois foram a um mesmo evento, uma festa de música sertaneja, e fizeram reportagens com o público e os músicos presentes. Ao final da exibição da matéria, com os dois no palco, ao vivo, Tas fala: “Vamos nos comunicar com o Sr. CQC, essa entidade suprema...”

Dentro do “switcher” um dos técnicos pergunta quem foi o vencedor. Não ouço quem respondeu, mas logo alguém está informando: “O gordo ficou”. “É o da direita.” São informações que ajudarão os técnicos que controlam as câmeras no palco. Mas Buezas grita: “O Marcel também!”. Ordem obedecida em segundos, a câmera que focaliza o perdedor também é acionada e uma imagem do outro candidato é exibida.

Flávio Torres/Fotomidia

Num intervalo, o repórter Rafinha Bastos chega no estúdio e é cumprimentado por Tas

Já passa da meia-noite. O programa ficou com uma audiência média entre 4 e 5 pontos. Mais ou menos na média habitual. Está todo mundo com aparência cansada. À 0h16, Marcelo Tas está finalizando o “CQC”, fazendo agradecimentos, quando o diretor e seus assistentes já se levantam do “switcher”.

Lá embaixo, seguranças isolam o palco, onde ficam os apresentadores, da plateia, que ameaça invadir o espaço, em busca de fotografias com Tas, Rafinha e Luque. O trio atende a todos com educação. Enquanto isso, técnicos começam a desmontar o cenário.

Dez minutos depois, no camarim, Tas comenta a edição. Está cansado, também, e um pouco abatido pelos imprevistos, que obrigaram o corte do “CQ Teste”. “O programa começou muito bem. Aí a gente se empolga e o tempo estoura.” Tas conta que além deste quadro, havia uma outra matéria programada e algumas brincadeiras que foram cortadas por falta de tempo.

“O diretor ficou puto”, ele conta. “No meio do programa, pediu para eu dar uma acelerada.” Mas são incidentes normais, explica. O programa muda toda semana no ar. Na semana anterior, conta, Buezas estava tão irritado que falou com Tas pelo ponto eletrônico enquanto o apresentador estava no ar, falando ao vivo. Tas diz que ao final do programa, perguntou: “Posso fazer alguma coisa para você não ficar nervoso?”

É 0h30. Boris Casoy está no ar com o seu telejornal. Rafinha Bastos, de short, deixa o camarim do “CQC”. Luque, de banho tomado, veste-se. Tas despede-se do repórter, cansado, mas bem-humorado. “Eu agora tenho que acalmar o diretor”. Semana que vem tem mais.

Fonte: Último Segundo

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